terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

do outro lado do poema

do outro lado do poema
sei dos ventos que sopram a rebate
e travam a palavra manchada de sangue e lágrimas
e sei das noites onde os fantasmas se gladiam
no deslumbramento das curvas de um corpo - poema
- o teu -
.

nas fantasmagóricas cenas de um brado
que se desfaz nos gumes das facas – pérolas
que se engodam na saliva metamorfoseada
no seco que a faringe – magoada -
não sente
anestesiada e sem retorno.
.

e em bebedeiras de lume e sudação
os trejeitos são tudo – nada
nuances de luxúria
íntimas e desagregadas
na mescla homogénea de (os) corpos – poema.
.
Foto:aniawojszel

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

da decadência


Da decadência das horas mortas
Na tarde dos frios de Fevereiro
Nas gaivotas sobre a areia molhada
Uma mulher lia inquieta
As palavras nas estrelas – ainda por nascer
Nas mãos desamparadas no regaço
Das roseiras podadas em Janeiro
E
Na decadência das horas incertas
Fazia cálculos de equações
De dias
Datas
E saudades nos fios brancos
Do cabelo que em tempos fora escuro
Não sabia
Não queria a decadência
Da tarde transformada em sementes
Lançadas na areia
.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

epitáfio

(em mémória de JP)

nessa noite, a rua amanheceu cheia de pássaros mortos e, a partir desse dia, a rua que para nós era a rua das flores,(embora tivesse o nome de um qualquer militar), passou a chamar-se a rua dos pássaros mortos.

nessa noite, morreste junto com os pássaros ou eles morreram junto contigo.

os cacilheiros, fizeram normalmente a sua travessia no rio e tudo foi igual a todos os outros dias. 

a chuva, caiu miudinha num dia frio, enfurecido e sem cor, próprio da estação invernosa.

nesse dia, a cidade perdeu o teu sorriso para sempre
.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

estas mãos





no crepúsculo da tarde, de repente, as palavras tingem-me as mãos em pinceladas de cores – palavras que eu, e só eu, consigo desenlear. são riscos que se conceberam no céu, em enigmas indizíveis para os restantes .



estas mãos, são as mesmas que, tremendo de ternura, deambularam pelo teu corpo, feito mar revolto com sabor a sal e cheiro de maresia.


mas eu já não as reconheço mais, porque elas não guardaram o teu aroma. são apenas mãos. eu cheiro-as e elas  apenas têm o cheiro de mãos.


na valência dos meus dedos, as palavras – mudas -   tomam conta de mim.


o  teu cheiro desvaneceu-se.