terça-feira, 26 de agosto de 2008

voando...

...disseram que parti! só o vento entendeu meu voo…
.
Autor©Piedade Araújo Sol 
Foto:Agnieska Motyka

Etiquetas: ,

terça-feira, 19 de agosto de 2008

metáforas em mim

quando amanhece,
eu já transpus todas as madrugadas,
e todos os sonhos adormecidos em mim.

quanto entardece,
eu já senti o descambar morno
de mais um dia extraviado em mim.

quando anoitece,
eu sei que vou para o povoado
dos rabiscos e das metáforas em mim.

A escapulir-me nas manhãs,
nas tardes
e nas noites,
eu desembaraço os riscos das metáforas dispersos em mim….
.
Foto:W-D

terça-feira, 12 de agosto de 2008

na sala de embarque de um aeroporto qualquer

na espera anunciada
e não desejada
desfio os meus pensamentos
desviados em farpas de mágoas
que nem ouso aprofundar.

a sala é enorme com espectadores
mudos
alitos
que desfiam pesares
absortos num mutismo envergonhado
e previamente imposto sem regras
sabe a coisa nenhuma, este estar aqui,
e abertos os olhos de espanto
nada sobeja.

Algures
um quadro luminoso
com números ,códigos

destinos,
tão impessoal
acho que já nem sei ler os números
as letras baralham-se
as letras são números
e os números são letras.

Serão?
não sei!
já nada sei
eu só quero ir
eu só quero chegar.


e como dia a canção:

-Quero chegar,
para voltar a partir
.


Foto:Julia

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Dissertações

A imagem que o espelho reproduz não é a minha. Doem-me as articulações dos dedos e as veias das minhas mãos parecem querer romper a pele seca e desidratada que ainda me cobre. As palavras que tento escrever vagueiam incrédulas e dispersas, formando sulcos nas páginas de onde não se podem ler as suas entrelinhas.

Como se quisesse atear-me a memória, uma aragem lúcida vinda da rua abraça-me pela janela e uma leve humidade parece infiltrar-se nos meus ossos, numa imitação virtual do longínquo clima sitiado na ilha.

Lembro tanta coisa. Ele tinha a sabedoria dos anciães do templo. Não que fosse crente. Não era! Mas as palavras saíam da sua boca como se fossem extraídas dalguma brochura, de cujo código ele já sabia as respostas mesmo antes de as perguntas serem formuladas.

Tinha o olhar vivo do fogo que parecia querer incendiar as matas escondidas, em terrenos recônditos e inóspitos, e no entanto também tinha a calma melancólica e cristalina das águas do riacho.

Gosto de o recordar e, por vezes, ainda voo nas suas palavras como se fossem asas dum sonho feito gaivota, carregado de sons e de cheiros que se foram perdendo com o passar do tempo já ido, mas não esquecido. Nessas recordações ainda não esqueci a explicação que ele dava sobre a existência do ser e sobre a nossa própria existência.


Sei que de nada serve estar para aqui a escrever, pois as palavras ficam somente aqui, difusas, para nunca serem lidas, e no entanto sei que nos mistérios ocultos da vida tudo ainda faz sentido.

Hoje vivo a serenidade da partida e da calma que ficou. Sinto apenas o orvalho que se desenha nos meus olhos como um cenário de recordações em cadeia, pérolas sentidas em telas de cristal….