As horas passam e eu não dou por elas, estou aqui estendida sobre as
memórias recentes,
apenas a olhar o mar e fazendo uma catarse de conjunturas idas.
Ao longe, o ladrar de um cão tira-me o torpor em que me encontro.
Ajeito o corpo e vasculho nas profundezas
do meu eu, explicações para factos que são inexplicáveis.
Gosto de estar assim a olhar o mar e fazer conjecturas,
sobre tudo e sobre nada,
e se por vezes pareço oca,
talvez seja uma defesa que eu engendro
para que o vazio não se inviscere em mim e nos meus ossos.
Não vou entender o questionável, não sei ainda abrir
as portas que bloqueei,
existem portas que se fecham e que nunca mais se devem abrir,
e sinto que por vezes a terra roda em volta do meu eixo somente,
e não me deixa ver o que existe além do além de mim.
Mas o mar continua azul e, assim sendo,
amachuco languidamente todos as meditações,
e sinto que afinal estou viva,
o relógio deve marcar tão-somente a tarde em que o sol se põe
e que devo ter sonhado.
Algures, ainda existe algo ou alguma coisa que eu não retive em mim,
mas que me fará ressurgir,
e, tão só por isso, eu ergo a minha vontade
e suavemente deslizo para a tarde
e para a vida que se adivinha.
Não sei a rotação do tempo, nem das marés,
mas ainda vou a tempo de saber.
©Piedade Araújo Sol 2013-09-16
Imagem : Michal Maciak
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