As galochas amarelas
Há muitos anos, a minha mãe ofereceu-me
umas galochas amarelas – eram lindas.
Usava-as quando chovia,
com meias brancas de corações encarnados.
Nessa altura, desenhava em tudo o que encontrava
e refugiava-me nas águas-furtadas
com o meu amigo imaginário,
a quem chamei Set.
Sobre a mesa onde estudava,
um desenho dele pendia da parede,
e conversávamos
coisas que só ele entendia.
Embora imaginário, era real para mim.
Um dia, pensei que também precisaria de galochas.
Pedi outras à minha mãe.
Ela, astuta, perguntou porquê.
Fiz birra – queria umas pretas.
Ganhei-as.
Coloquei-as ao lado do desenho.
Nunca as calcei. Eram do Set.
A mãe, sempre atarefada,
nunca descobriu o meu segredo.
Autor © Piedade Araújo Sol 2025-02-24
Imagem : Jessica Drossin
Etiquetas: Direitos de autor, Piedade Araújo Sol, poesia
2 Comentários:
Quem sabe se o Set não passeava com as galochas quando ninguém o via?
Há segredos inconfessáveis...que nos ajudam a " atravessar" a vida....
Beijos e abraços
Marta
Que linda história da imaginação e das memórias que nos acompanham pela. As chuvas sempre despertam poesias para quem pôde andar sob elas, calçados ou não, brincando pela enxurrada com os barquinhos ou uma lata por ela levada. E aí o amiguinho surge em nossa companhia e temos está lindeza amiga
Lindo de ler e criar as imagens.
Bjs
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